O PODER DO INVISÍVEL

O PODER DO INVISÍVEL


A cosmologia diz que tudo o que existe está mergulhado em um tecido invisível chamado espaço-tempo. A massa dos corpos distorce esse tecido e provoca fenômenos como a gravidade. Mais ainda, os corpos que conhecemos, quase todos apreendidos pelos sentidos, correspondem a apenas quatro por cento de tudo o que existe no universo. Essa constatação foi feita matematicamente, mas confirmada empiricamente várias vezes. O motivo é que, para que as coisas físicas tenham sentido, é necessária a admissão de que há 96% de coisas invisíveis, intangíveis. Tudo o que imaginamos que existe, tais como os átomos do seu corpo e do seu celular até as colossais galáxias, é muito pouco em relação ao todo que precisa existir para que o que existe tenha sentido, tenha lógica. Essa energia e matéria escuras, como foram denominadas pelos cientistas, ou fluido cósmico universal, como outro ramo da ciência cataloga também tem similar no campo gerencial e organizacional. Neste sentido, este ensaio tem como objetivo mostrar que as coisas que percebemos são efeitos de coisas que não vemos.

Se você entrar na página das organizações profissionalizadas, que utilizam conhecimentos e recursos científicos e tecnológicos de gestão, verá que quase todas as ameaças e oportunidades que listam são nominações de fenômenos físicos. Geralmente listam coisas do tipo “aumento da demanda por inovação tecnológica”. Demanda significa número de pessoas e organizações que querem e podem comprar alguma coisa. Pessoas, portanto, são entidades físicas, que podemos ver os olhos delas, pés, cabelos e outros de seus aspectos. Ainda que digam “redução no consumo de tecnologias embarcadas”, consumo também é algo físico, passível de ser detectado fisicamente, bastando para isso consultar registros de vendas.

Mas essas ameaças e oportunidades detectadas são apenas o impacto que coisas sequer imaginadas provocam. Demanda e consumo são fenômenos derivados da decisão individual de pessoas e organizações. Essas decisões são provocadas por conjunções de aspectos diversos, mas todos oriundos de expectativas, anseios, esperanças, que podem ser afetados por ocorrências físicas, tais como a demissão de um membro da família ou rompimento de contrato de um grande cliente, e não físicas, como mudanças nas expectativas de outras pessoas e organizações (que são decisões humanas). Em última instância, portanto, os fenômenos físicos dessa natureza são todos causados por fenômenos extrafísicos. E o pensamento é o elemento extrafísico mais próximo de nossa compreensão.

Não se pode confundir, contudo, os produtos do trabalho do cérebro, como a cognição, do que o campo mental faz. O cérebro é uma coisa e a mente é outra. O cérebro é físico e produz fenômenos físicos; a mente é extrafísica e produz fenômenos extrafísicos e físicos. O cérebro colabora (e muito) para com o campo mental, mas é apenas instrumento intermediário entre as coisas do corpo e da mente. Finalmente, não se pode confundir o corpo com as realidades mentais e espirituais. São três entidades distintas e interrelacionadas, cujas explicações não cabem aqui.

Sinteticamente, as coisas funcionam mais ou menos assim: o cérebro é local de processamento e armazenamento de informações e conhecimentos (que são informações com sentido); a mente é o campo onde expectativas, vontades, esperanças e fenômenos similares habitam e que conformam todo o corpo físico. Assim como o corpo físico, o corpo mental é composto de energias que se irradiam localmente, ajudando a formar o campo psicosférico, juntamente com o campo mental de outros indivíduos. Esses campos se formam por afinidade, de maneira que expectativas favoráveis se unem com similares e antipatias se unem com antipatias para conformar um ambiente pesado.

Trazemos à lembrança, com a ajuda do cérebro, a tela da mente justamente pelo que chamamos de pensamento. Como os pensamentos são expressões dos sentimentos, forçam os indivíduos ao compartilhamento de suas expectativas, ansiedades, raivas e outros habitantes do campo mental. E à medida que se avolumam, mais e mais a psicosfera vai se conformando com a urdidura dos pensamentos individuais. E dessa urdidura nascem as decisões políticas, por exemplo, sobre não mais investir em determinado tipo de tecnologia, da mesma forma que urdiduras legais forçam o lançamento de editais com determinadas restrições. Organizações privadas poderosas urdem a formação de alianças com poderes tais que deformam o ambiente de atuação das organizações de ciência e tecnologia tal qual um planeta massivo deforma a tessitura do espaço-tempo.

Quando os reitores de universidades e institutos federais se unem para planejarem ações conjuntas estão fazendo urdiduras, que são atitudes externalizadoras de pensamentos. Em termos de gerenciamento de inovação tecnológica, os dirigentes precisam aprender a perceber o ambiente a partir da identificação dos grupos de urdidores para que possam fazer parte deles. E esses grupos se formam (e se diluem) o tempo todo. Mas apenas uns poucos vingam, se consolidam e se tornam poderosos, como é o caso dos fóruns de pró-reitores, em nível nacional, e os conselhos de dirigentes, em nível institucional dos institutos federais. Quem participa desses grupos sabe, com muita antecedência, que possíveis transformações o ambiente externo poderá sofrer no futuro próximo ou distante, coisa que é considerado premonição ou profético pelas informações que algum membro deixa passar e que são vendidas pelos premonitores e profetas.

Diretor de campus precisa participar dos grupos locais, da mesma forma que os reitores precisam acompanhar pelo menos os grupos nacionais de urdidores. Acompanhar e fazer parte deles. Isso lhes levará à familiaridade com a conformação dos seus ambientes de atuação (que são inúmeros) para com o pensamento estratégico institucional (que também é um fenômeno extrafísico). Conformar o pensamento ambiental com o pensamento institucional é o grande desafio de todo gestor, que chamamos de alinhamento estratégico ampliado. É justamente disso que trataremos com os próximos 15 artigos.


Dr. Daniel Nascimento e Silva

Dr. Daniel Nascimento e Silva

PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)



O que achou deste artigo?