FALHAS NOS ATRIBUTOS DO PRODUTO

FALHAS NOS ATRIBUTOS DO PRODUTO


Daniel Nascimento-e-Silva, PhD

Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)

 

Os produtos se caracterizam por meio de seus atributos. Isso quer dizer que eles apresentam algo que os diferenciam uns dos outros, principalmente dos concorrentes. E essa diferenciação precisa estar presente essencialmente na mente dos seus usuários e clientes. Ainda que na maioria das vezes o consumidor final tenha dificuldade de comparar um produto com o outro em seus aspectos técnicos e de desempenho, essa capacidade aumenta em muito em relação aos atributos. Uma coisa é dizer que um produto A apresenta um nível de autonomia de 10.000 horas de uso, enquanto o produto B detém 8.000 ou menos. Outra coisa muito mais significativa é fazer o julgamento de que o produto A dura muito mais do que o produto B. A razão disso é que desempenho e atributos técnicos são conhecimentos com adequação apenas por pessoas qualificadas para tal, enquanto os atributos são facilmente colados nas telas mentais dos indivíduos. As falhas nos atributos do produto são, portanto, a primeira constatação de sua desconformidade, como será mostrado aqui.

Uma determinada organização industrial reclamava há vários anos que um dos braços dos robôs de certa linha de produção constantemente apresentava problemas. Além do problema constante, a sede da empresa onde os mecanismos eram produzidos era extremamente distante de suas filiais espalhadas pelo mundo, o que implicava na dificuldade tanto no conserto quanto na reposição de peças e componentes. Quando a empresa trabalhava em três turnos, as quebras eram quase que certas de acontecer. Por esse histórico de problemas, os operadores da linha de produção tinham um sonho por todos compartilhados: um mecanismo que aguentasse o tranco do terceiro turno por pelo menos um mês, que não fosse tão complexa a manutenção, o conserto fosse rápido e houvesse peças de reposição disponíveis para substituição imediata.

Essa descrição aponta duas coisas, que os linguistas chamam de ditos e interditos.

Os atributos são características dos fatos e fenômenos do mundo que os distinguem uns dos outros. O dito é a expressão semântica, literal, do que está sendo falado, enquanto o interdito está vinculado com a proibição, com o que não se pode falar. No nosso exemplo estão sendo descritos os atributos de um mecanismo industrial desejado por todos os operadores. Ao mesmo tempo está sendo dito que o mecanismo que está sendo utilizado não tem esses atributos. Os operadores não podem dizer, por exemplo, que estão utilizando “uma porcaria” de equipamento, como falavam reservadamente. Por essa razão, ouvir os relatos dos operadores é essencial para que as falhas sejam detectadas. E isso vale também para as inovações tecnológicas.

A lógica desse procedimento reside no fato de que não são os cientistas que inventaram o artefato tecnológico que vão operá-lo durante toda a sua vida útil. Ainda que produzam apenas um ou pouquíssimos exemplares da inovação, não são os inventores que o farão funcionar o tempo todo. Daí a fundamentalidade de se criarem atributos que realmente representem a descrição efetiva do produto, o que envolve tanto seus aspectos técnicos quanto os seus desempenhos. Quando alguém fala que determinado produto “é pau pra toda obra” está querendo dizer que aquele produto é confiável, adjetivo que vem de um atributo de desempenho, confiabilidade, que significa funcionar sempre da mesma forma. Mas também quer dizer que o produto é robusto, que vem de vários adjetivos, como inquebrável e forte, originários, também, de características técnicas e de desempenho.

Se essas características conseguirem o feito de estarem na tela mental dos operadores, ficará facilitado o desafio de detectar falhas e desconformidades na invenção como um todo. É que o artefato tecnológico é criado para apresentar determinados desempenhos a partir de determinadas características técnicas. Quando esses resultados não se verificam na prática, provavelmente as características técnicas apresentam falhas que, por sua vez, refletem na mente dos operadores. Dito de outra forma, a tecnologia, quando opera normalmente, provoca uma certa normalidade operacional na mente dos indivíduos. Quando essa normalidade é quebrada, a normalidade operacional também o é, mas na tela mental das pessoas. Assim, atributos marcantes das tecnologias deixam marcas firmes na mente das pessoas que ajudam a identificar suas falhas e desconformidades técnicas e de desempenho.

Uma universidade contratou a criação de uma tecnologia específica para o seu laboratório de genética. A máquina se caracterizava por um leve zumbido, primeiro crescente, para desaparecer com o tempo, geralmente cerca de meia hora depois que começava a operar. No ápice do barulho, contudo, ninguém se percebia incomodado por ele. Mas quando a máquina estava com problema, e um dos quais afetava diretamente o resultado das análises, o zumbido não aparecia assim que a máquina era ligada. Assim, o atributo da máquina operando normalmente era a produção do barulho, enquanto o atributo com problema era a ausência do zumbido, em uma completa inversão do senso comum. No entanto, ainda aqui, os atributos cumpriram seu papel de ajudar a detectar falhas.

A ciência da busca por falhas em produtos distingue dois tipos de procedimentos relacionados aos atributos. O primeiro é quando a tecnologia apresenta os problemas, que é a parte perceptível pelos sentidos (visão, audição, paladar, tato e olfato), que nos dá a quase certeza de que há alguma coisa errada ali. A segunda é decorrente do fato de que uma tecnologia pode estar com problemas imperceptíveis aos sentidos, exigindo o uso de recursos especiais e até extraordinários para que possam ser detectados. Apesar das falhas da tecnologia serem da primeira ordem, os problemas imperceptíveis quase sempre são de natureza de seus componentes, como será mostrado a seguir.


Dr. Daniel Nascimento e Silva

Dr. Daniel Nascimento e Silva

PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)



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