AS BASES DE DADOS

AS BASES DE DADOS


Temos utilizados determinados termos específicos das áreas de Administração e Engenharia de Produção no método científico-tecnológico para facilitar o entendimento dos diversos aspectos que essa metodologia envolve. Um desses termos é estoque de conhecimentos, para representar a ideia de que a ciência é uma grande fábrica cuja produção é justamente as diversas formas de explicar o comportamento da realidade. Suas diferentes linhas de produção têm em comum apenas o fato de utilizarem o mesmo mecanismos de conversão de matérias-primas (que são conhecimentos) em produtos finais (os novos conhecimentos). Essa analogia prossegue assim: quando os novos conhecimentos são finalizados, eles são disponibilizados em grandes armazéns. Esses armazéns são muitas vezes chamados de repositórios, como são os casos dos repositórios institucionais, que armazenam monografias, teses, dissertações e outras modalidades de produção acadêmica; noutras vezes são chamados simplesmente de base de dados, como são os casos das revistas científicas. É esse universo que os cientistas dominam com profundidade e agem sobre ele.

Os cientistas têm muita intimidade com as inúmeras bases de dados existentes no planeta. Essa intimidade demarca o grau de internacionalização das atividades de cada pesquisador. Por exemplo, tem pesquisadores cujo raio de relacionamento é bastante limitado. Essa limitação pode ser de ordem linguística, como nos casos de pesquisadores que só acessam documentos em sua língua materna, de área (casos em que o pesquisador só se atém ao que é publicado na sua área, mantendo-se sem comunicação até mesmo com áreas próximas e adjacentes) e geográfica, onde se enquadram os estudiosos que se interessam apenas pelo que foi produzido em determinada região ou por pesquisadores dali. Dessa forma, há bases de dados locais, regionais, nacionais e internacionais. As bases de dados locais são exemplificadas pelos repositórios institucionais. Os periódicos Capes são exemplos de base nacional e a Scielo configura demonstração de base internacional, porque envolve diferentes países.

Há, portanto, bases pequenas, com poucos documentos, e gigantescas, com milhões de documentos. A Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br/) é uma base gigantesca, que armazena documentos de praticamente todos os países do mundo. Como o acesso a ela é livre, sofre a consequência negativa de muitos dos produtos ali armazenados serem de baixíssima qualidade. Mas há muita coisa de valor precioso. E muita mesmo. Some-se a isso o fato de ser uma base de dados em que a maior parte do seu estoque está disponibilizado gratuitamente. A maior parte, não tudo. A razão disso é que uma busca pode resultar em vários documentos vinculados a bases de dados pagas. E isso é muito importante, principalmente para o pesquisador iniciante. Vejamos uma ilustração.

Se quero saber quais são os tipos de produtos do processo de organização, tenho que conhecer tudo o que as comunidades científicas já produziram e estocaram sobre esse fenômeno. E tudo é tudo mesmo. Os cientistas de verdade não escolhem este ou aquele estudo em detrimento desse ou disso. Muitas vezes terão acesso a uma quantidade considerável de artigos gratuitamente (ou pago pelo governo, como é o caso dos periódicos Capes). Mas acontece, e muito, de se encontrarem artigos cujo acesso só pode ser feito se se pagar. Em média, um único documento custa 40 dólares. Se forem necessários 100 desses documentos, o investimento financeiro chega a 4.000 dólares, o que equivale a mais de 20 mil reais, na cotação de junho de 2021. E isso apenas para ajudar a responder uma única questão, que é quais são os tipos de produtos do processo de organização.

As bases de dados pagas, por incrível que pareça, detêm os periódicos mais renomados. É o que chamamos de revista científica de grife. Por quê? Porque quase sempre elas têm registro na Scopus e Web of Science, por exemplo, que são instituições extremamente rigorosas no conteúdo que publicam e avaliam. Há revistas que recebem centenas de estudos científicos válidos, mas que publicam menos de 10 a cada número, tal o rigor que aplicam na avaliação daquilo que vão publicar. É que além da obediência a todas as regras de produção do conhecimento, outras exigências são adicionadas para as quais a maioria dos cientistas do mundo não estão preparados. Mas a qualidade do que se encontra ali é quase que inquestionável, principalmente quando comparado com a grande quantidade de estudos de baixa qualidade (que os cientistas sérios chamam de lixo) depositados no Google Acadêmico.

Para a maior parte dos pesquisadores brasileiros, que só têm acesso ao limitado Periódico Capes, o jeito é minerar conhecimentos nas bases gratuitas. Mas aí a experiência científica tem que falar mais alto. É preciso estabelecer critérios rigorosos para que o acesso seja feito apenas a artigos de qualidade pelo menos razoável. Um desses critérios é buscar apenas artigos que tenham uma seção de metodologia consistente, bem escrita, clara e precisa. Outra exigência é que o artigo apresente uma arquitetura teórica ou marco teórico constituído a partir de conhecimentos gerados com base em estudos nacionais e internacionais, preferencialmente publicados nos últimos cinco anos. E a terceira é que o artigo deixe claro e demonstre a sua contribuição para a ciência.

As bases de dados são armazéns que estocam conhecimentos, especialmente os produzidos com o auxílio do método científico. Os conhecimentos científicos são as matérias-primas utilizados pelo método científico-tecnológico para a geração tanto de novos conhecimentos como para a produção tecnológica. Infelizmente, a grande parte dos conhecimentos estão limitados os seus acessos a apenas quem lhes pode pagar, o que leva grande parte dos pesquisadores a usar as bases de dados gratuitas, com a maior parte de seus produtos de baixa qualidade. Para não comprometer sua produção, é necessário que critérios sejam estabelecidos para a mineração de matérias-primas confiáveis. Isso será mostrado depois.


Dr. Daniel Nascimento e Silva

Dr. Daniel Nascimento e Silva

PhD, Professor e Pesquisador do Instituto Federal do Amazonas (IFAM)



O que achou deste artigo?