Luto

A dificuldade dos amores presentes está nos lutos mal resolvidos das relações passadas


Uma pesquisa realizada pela Meta e instituto Gallup revela que hoje as pessoas vivem uma epidemia global de solidão. Conforme os dados, uma a cada quatro pessoas se sentem sozinhas e um dos motivos é a ausência de vínculos afetivos profundos.


"No Brasil, com o crescimento da taxa de divórcios, que chegou na marca dos 160% nos últimos 10 anos, segundo o IBGE, e com a média do tempo de casamento que passou de 16 para 13 anos, pode-se constatar de que um dos vínculos que mais tem se enfraquecido é o vínculo romântico", explica a psicanalista e especialista em relacionamentos, Carol Tilkian.

Com a chegada do segundo semestre a especialista observa uma crescente verbalização de carência, frustração e solidão. "A chegada do meio do ano marca para muitos a angústia de que metade de mais um ciclo se passou e, mais uma vez, os vínculos românticos não foram estabelecidos. Termos como “heterepessimismo” e “boy sober” – proposta de mulheres que almejam ficar 1 ano “sóbrias” de relacionamentos afetivos com homens para se desintoxicarem emocionalmente – ganham pautas bem como a Agamia – movimento que defende o abandono da busca por vínculos românticos", ressalta Carol.

O senso comum tende a culpar a tecnologia, a volatilidade de nossos tempos, a lógica neo-liberal e o vício em dopamina como causas para essa dificuldade de construção de novas relações amorosas. Porém, enquanto muitos problematizam o presente e o futuro, a psicanalista e pesquisadora de relacionamentos Carol Tilkian, convida a também olhar para os lutos não elaborados das muitas relações interrompidas e, nem sempre, choradas e cicatrizadas.

Enquanto a sociedade geralmente reconhece o luto por uma morte física, o luto por um relacionamento que terminou muitas vezes é subestimado, negligenciado e até incompreendido. “Num mundo que nos pede pra virar a página, partir para outra, abrir o aplicativo de relacionamento, é fundamental se permitir parar, chorar, velar, ritualizar os finais para que possamos dar contornos para nossas vivências emocionais e nos dar espaço de significação, elaboração e reconstrução de nós mesmos e de nossa conexão com o mundo", ressalta.

“A questão é que a maioria de nós não se permite viver esses lutos de amor profundamente. E muitos desses fantasmas ecoam em nós até hoje. Fazendo com que você entre em novos relacionamentos carregando medos e ecos do passado.” reforça a psicanalista. Neste sentido, é importante pontuar que o término de um relacionamento pode ser comparado a uma pequena morte, o luto dos planos e expectativas, de quem você era junto do ser amado, dos sonhos compartilhados e de uma intimidade construída ao longo do tempo.

Enquanto as diversas camadas do luto não forem elaboradas e as pessoas não se permitirem viver os vazios e as emoções que afloram deles, a tendência é que elas transformem as relações passadas em traumas, e voltem a se relacionar cada vez mais inseguros e acuados.  Sendo assim, cada luto mal resolvido pode ter consequências profundas para a saúde emocional e mental dos indivíduos.

A psicanalista e especialista em relacionamentos, Carol Tilkian, também ressalta que o processo de luto é necessário para a recuperação emocional e envolve várias etapas. “Aceitar sem tentar entender o fim talvez seja o primeiro e maior desafio num mundo onde temos cada vez mais a ilusão de controle. O luto se inicia quando escolhemos decretar o fim daquele amor, ainda que sigamos amando a pessoa que nos abandonou. Este é um movimento difícil pois faz com que cada um tenha que acessar seu desamparo estrutural, um tema pouco abordado e de extrema importância” relata.

 

Impactos na saúde e estratégias para superar

Quando o luto por um relacionamento não é adequadamente enfrentado, mesmo que a pessoa volte à vida social e amorosa, é comum que a mesma se coloque de maneira insegura, ressentida e defendida, traços que têm dificultado as conexões românticas no presente. “Digo que no amor nossa experiência depõe contra nós. Se não nos dermos tempo, cuidado e ferramentas para elaborar os lutos amorosos – seja de um casinho de 2 meses ou de um casamento de 20 anos – seguiremos presos num looping de ressentimento, arrependimento e sensação de rejeição", enfatiza Carol Tilkian.

Para tanto, há algumas estratégias para a superação desse momento. "Elaborar não é esquecer, é ressignificar. Precisamos abandonar a fantasia de que superar alguém é ver esta pessoa e nunca mais sentir nada. O processo de superação consiste em ajudar a pessoa a reinvestir sua libido em novos amores e vínculos seguros, que a nutrem de maneira significativa. Significa também se permitir ter raiva, chorar e simbolizar tudo isso. Outro ponto importante é perceber como cada luto amoroso te remete à perdas anteriores da sua vida – relações familiares, de amizade ou de antigos amores. Lembrando que o tempo psíquico não é o tempo do relógio”, indica a especialista.

Percebendo a demanda crescente de pessoas que querem se relacionar amorosamente mas ainda carregam dores do passado e marcas de desamparo e rejeição, Carol Tilkian acaba de lançar um curso na Casa do Saber chamado Luto, abandono e rejeição: Como lidar com o fim das relações. O curso faz parte da plataforma online e conta com cinco aulas pautadas na psicanálise, sempre trazendo paralelos simples para aplicação cotidiana. Esse é o início da parceria de Carol Tilkian com a Casa do Saber e, a partir de Junho Carol passa a fazer parte do time de renomados psicanalistas escolhidos pela Casa para trazer conhecimento sobre relacionamentos para todos os brasileiros. As informações do curso já estão disponíveis no site casadosaber.com.br.

 

Por Nathalia Alcoba

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