ORGANIZAÇÃO DE DADOS PROCESSUAIS: MATRIZ
Os dados processuais são decorrentes das questões que procuram compreender a dinâmica de determinado fenômeno. Quando esses problemas são formulados, o interesse do cientista é entender a mudança de comportamento de determinado aspecto da realidade. De forma analógica, seu desafio é identificar todas as etapas que vão de um estado A para um estado B, configurando aquilo que a ciência denomina de processo. Um processo, portanto, é um sequenciamento lógico de etapas, com início, meio e fim, e que, quando a última etapa for concluída, uma mudança pode ser aferida em determinado fenômeno. Em termos de geração de tecnologia, as questões processuais são aquelas que procuram estabelecer as etapas necessárias para que um determinado artefato possa ser construído. Assim, quando a última etapa desse processo é concluída, a tecnologia pretendida é materializada. É essa a imagem mental que o cientista detém quando elabora questões, coleta e organiza dados de natureza processual.
A massa de dados processuais é muito diferente da massa de dados conceituais e estruturais. A razão dessa diferença é que os dados conceituais são compostos de apenas dois elementos: termos de equivalência e atributos, enquanto os dados estruturais são como peças de um quebra-cabeças com formatos e tamanhos diferentes. O que caracteriza os dados processuais é a temporalidade. É por essa razão que as massas de dados tornam visíveis todas as etapas do processo, anotando-se com precisão a etapa (se primeira, segunda etc.) e no que exatamente ela consiste. Por exemplo, para o processo de elaboração de um plano estratégico, a primeira etapa pode ser a revisão dos objetivos estratégicos atuais e a segunda, a análise das estratégias utilizadas. Isso só se torna possível porque a literatura científica aponta de forma explícita tanto a etapa quanto o conteúdo de cada uma delas.
A organização dos dados processuais permite visualizar inúmeras características da ciência enquanto esforço universal de compreender a realidade a partir da compreensão de cada um de seus fenômenos. E uma desses atributos essencialmente científicos é o fato de que não há uma única explicação plausível, demonstrável acerca do comportamento de determinado fenômeno, qualquer que seja ele. Quando se elabora a matriz de dados processuais percebe-se que uma primeira etapa identificada no estudo A pode ser a segunda no estudo B e a quinta no estudo C. Contudo, em cada um deles, aquela etapa cumpre o seu papel com uma lógica perfeitamente delineada, consequente e lógica. Isso confirma o fato de que a realidade permite diversos caminhos para um mesmo destino, ainda que provisório. É a constatação efetiva de que 2+2=4, 3+1=4, 5-1=4 e assim por diante.
A segunda lição que se aprende com a organização dos dados processuais é que é extremamente nociva a ideia de se apegar a uma determinada explicação ou lição de mundo em detrimento de outras. É por isso que na ciência não se diz “fulano é Autoriano”, no sentido de seguir as ideias de determinado autor e ser orientado por ele ou que “Beltrano é Beltraniano”. Na ciência não se trabalha com um autor ou com a ideia de um autor. O foco da ciência é o fenômeno. Por essa razão trabalha com todas as perspectivas e todas as visões de mundo, tantas quantas forem possíveis, uma vez que há limitações de método e instrumentais tecnológicos para tal (o que força investigações com o intuito de reduzi-las ou eliminá-las). O apego a autores e ideias é típico da filosofia e da religião, ainda que travestidas de bases conceituais.
A terceira coisa que se percebe com a matriz de dados processuais é como a realidade é complexa. Entenda-se complexidade como a teia de eventos que concorrem para a produção de determinado comportamento. A matriz é feita colocando-se na primeira coluna a identificação dos autores, com um estudo para cada linha, e as etapas nas demais colunas, tantas quanto forem a quantidade delas. Se um estudo apontar cinco etapas, cinco colunas serão adicionadas; se apontar 50, 50 colunas farão parte da matriz de dados organizados. Quando todos os estudos forem desmembrados em suas respectivas etapas, vislumbram-se todos os subprocessos que compõem cada processo de cada etapa do fenômeno, no caso de fenômenos de alta complexidade. De forma semelhante, a singeleza de outros pode ser percebida com precisão.
Quando se está diante da matriz de dados processuais, que é a primeira etapa da organização desses dados, não é possível distinguir processos de subprocessos. É necessário aplicar um procedimento específico para que a lógica oculta naquele caleidoscópio possa ser percebida. Nunca é demais asseverar que qualquer que seja o procedimento utilizado, é necessário que esteja fundamentado na própria ciência. Se desejo saber quais são as principais etapas do processo, o procedimento é um; se a intenção for a constituição do processo, o procedimento será outro. O que determina o tipo de procedimento a ser utilizado é sempre uma teoria ou um campo teórico. Uma teoria é uma explicação específica, como a teoria da motivação de Maslow, enquanto um campo teórico é um agrupamento de teorias sobre o mesmo fenômeno, como o campo teórica da motivação, que engloba dezenas de teorias com a finalidade de explicar o comportamento humano.
A matriz de dados resultante permite que seja reconstituído o estado da arte dos fenômenos processuais, que é o que vai compor a revisão da literatura desses estudos. Começa com os resultados conceituais, como mostramos anteriormente, e prossegue com os achados processuais. Dependendo do interesse do cientista, questões estruturais podem anteceder as descobertas processuais, para que se tenha um raio x do fenômeno; se o interesse for a fisiologia ou metabolismo, substituem-se as questões processuais pelas funcionais, como será visto mais adiante. Elabora a matriz, está-se pronto para a síntese, que apontará a grande descoberta desta parte da investigação.