O CORNO DO BINÓCULO
Vou contar uma história que faz parte do anedotário do Beiradinho lá no Vale do Rio Jari, divisa do Amapá com o Pará. Beiradinho é o apelido da cidade de Vitória do Jari, enquanto que Beiradão é o de Laranjal do Jari.
Chamam assim porque a maior parte das duas cidades está sobre palafitas na orla do Rio Jari, com seus “shoppings” a céu aberto sobre as passarelas de madeira e concreto.
Quando você chega de barco, a visão (do inferno) é aquele monte de casas de madeira podre, um fuzuê danado, banquinhas de venda de comida, camelôs, prostitutas, michês e trabalhadores. Enfim, uma montoeira de gente.
É barco que chega, é barco que sai, é catraio atravessando de minuto em minuto para Monte Dourado (PA), vizinho do Beiradão ou para a Vila Industrial de Munguba, onde estão as fábricas de celulose (Jari Celulose S.A.) e a de caulim (CADAM – Caulim da Amazônia S.A.).
Detalhe: a mina de caulim está no lado do Amapá, cujo minério é transportado por baixo do rio por mineroduto. Fizeram a fabrica no Pará: ou seja, alguém passou a perna no Amapá...
Também com esses governantes socialistas que o Amapá teve só podia dar nisso (rsss).
Nesse cenário, Gevaso é o protagonista da história, mais conhecido na cidade que nota de R$ 10,00 porque era bem cômico e muito gordo. Mas a turma zuava muito o nome dele:
-Ei, GeVASO, vem aqui, deixa eu dar uma cagada em ti! (rsss)
De tanto os meninos fazerem bulliyng com ele, adotou a corruptela de Gê.
-Eu sou o Gê, o ponto G da mulherada – se vangloriando que fazia as fêmeas gozarem muitas vezes na cama.
Papo furado, a mulherada tinha orgasmo era de alivio quando ele saía de cima delas com seus quase 150 kg (kkkkk).
Gê ganhava a vida como barqueiro. Detinha o monopólio do transporte de açúcar de Belém para o Beiradinho, Beiradão, Monte Dourado e Almeirim. Tanto que batizou o barco dele de Gê-Coopersucar, em homenagem à escuderia brasileira de F1 criada pelos irmãos Fittipaldi na década de 1975.
Quando perguntavam qual a profissão do Gê, ele falava:
-Sou adoçante! Eu adoço a vida de todo mundo aqui no Vale do Jari (rsss).
Gê era solteiro, mas um dia ao frequentar o Putanic encontrou o amor da sua vida. Putanic era uma boate (tá! Admito: era um puteiro) que o lendário Barbudo Sarraf fez em cima de uma balsa.
Quando enchia com seus 300 lugares, a balsa subia Rio Jari acima tocando brega e a turma se deliciando com os prazeres da bebida e da carne, porque era frequentada pelas prostitutas daquele Vale, que não eram poucas. Tinha até cabines para alugar por momento. Por isso, o nome Putanic.
O puteiro, digo, a boate só atracava de volta no porto do Beiradão quando o sol cegava os olhos da meninada.
Gê viveu alguns anos em perfeita harmonia com sua amada Carmona Emengarda, que lhe deu um filho, o xodó da vida de Gê. Ele era extremamente apaixonado por aquela jovem, de pernas grossas de tanto beber açaí do puro com farinha baguda e ostentava uma bela rabeta. Quando ela desfilava pelas “passarelas” do Beiradinho ela parava o trânsito de bicicletas (kkk).
Nas viagens a Belém para buscar açúcar, ela aproveitava a ausência do Gê e fazia alguns biscates (perdão pelo trocadilho maldito) para aumentar o orçamento familiar (rss). Era um entra e sai danado durante a noite naquela casinha verde e rosa, que mais parecia o barracão da Mangueira (rss).
Quando Gê descobriu, ele encheu Carmona Emengarda de sopapos. De imediato ela acionou a Lei Maria da Penha e ganhou uma MPU (medida protetiva de urgência), cuja maior condicionante era ele ficar afastado mais de 300 metros da amada.
Só que ele não sabia – diziam as más línguas – que tanto a Delegada de Polícia, como a Promotora de Justiça e a Juíza da Comarca também apanhavam dos seus maridos (kkk).
As três eram mais brabas que onça dando leite (rsss) e na audiência de custódia mandaram tirar as algemas de Gê e deram uma severa advertência:
-Senhor Gervaso, desta feita vais ficar solto com tornozeleira. Mas ai de ti se te aproximares da vítima: vamos decretar sua prisão preventiva e vais apodrecer na penitenciária.
Temeroso, Gê cumpria à risca a ordem judicial porque sabia que as três autoridades desafogariam todas as mágoas de suas tristes sinas nele, um pobre coitado!
Mas por dentro o peito de Gê estava dilacerado, com o coração sangrando! Dizem que amor de puta quando pega é que nem chiclete grudado no cabelo! É avassalador.
Gê ficou morando no pequeno camarote do barco e fazia o rango na cozinha da popa.
E de longe no cais do Beiradinho, Gê enxergava muito mal o ninho do amor pintado de verde e rosa. Só dava para observar o acender e apagar das luzes encobertas pelas brumas do Rio Jari durante as madrugadas torturantes.
Curioso para descobrir quem eram os convidados daquelas festinhas de Carmona Emengarda, Gê comprou um poderoso binóculo.
E Gê passava a noite na proa do barco no cockpit de comando com o binóculo observando o negócio de Carmona Emengarda progredir de vento em “popa” (perdão pelo trocadilho de novo, rsss).
Gê, como todos os homens criados sob um regime machista, não tinha o alcance de entender que era a profissão dela. Inclusive, nos países mais avançados prostituição é profissão. Aliás, uma das mais antigas profissões. Ela não fazia isso por maldade, apenas queria ganhar os trocos dela numa terra de poucas oportunidades de emprego.
E por causa dessa mania de ficar espiando a amada de binóculo, a turma ao invés de tripudiar de Gê com os dedos em forma de chifrinhos na cabeça, quando passava por ele fazia um par de óculos com o dedo indicador e polegar de cada mão invertidos em forma de círculo, imitando um binóculo (kkk).
Vocês se lembram de um ex-presidente que possivelmente encheu os picuás de cachaça numa cerimônia em Brasília e teria se mijado todo e, ao lado de uma senhora dentuça, imitou um binóculo fazendo caretas, um dos maiores micos de um Estadista Brasileiro (rss)? Daquele tipo...
Gê aceitou de volta a amada e viveram felizes para sempre!
Mas a turma não perdoava:
-Lá vai o corno do binóculo!